Parafraseando a Dr.ª Rute Remédios, as opiniões são como as vaginas: cada uma tem a sua e quem quiser dá-la, dá-a. Neste blog, Julie D´aiglemont dá a sua. Opinião, claro. E nem sempre da forma mais respeitosa. Isso ofende a vossa sensibilidade? Então, ide, ide. Ide ler o programa de um qualquer partido de extrema esquerda, que de certeza é mais consentâneo com vossos princípios morais.





quinta-feira, 29 de abril de 2010

Crónica de um nascimento atribulado

Ao início da madrugada do quarto dia após a Revolução dos cravos, M. começa a sentir sinais de rebelião vindos do âmago das suas entranhas. Mas não são fervores revolucionários. Nem gases. É a criatura que aloja em seu ventre a revelar o inconformismo que a caracterizará no futuro.
Em desesperada correria, L., o garboso marido, conduz M. ao hospital.
Mas o médico que deveria assistir ao parto não está. Telefonam para casa. O senhor doutor foi com a esposa ao cinema, diz a criada.
L., o fervoroso cônjuge, obriga à interrupção de “Jesus Christ Superstar” para que se clame pelo senhor doutor (que, mais tarde, agradeceria o gesto, pois custava-lhe dormir em tão incómodas cadeiras).
A criatura havia efectuado movimentos pouco graciosos, que levaram a que enrolasse o cordão umbilical à volta do pescoço – o que já augurava um futuro pouco promissor no âmbito do exercício físico.
E denunciando um apetite pantagruélico, iniciara a ingestão de líquido amniótico.
O senhor doutor vaticina: mesmo que consiga salvar o ser, este poderá sofrer danos cerebrais.
O inapto ente nasce.
L., o orgulhoso pai, diz que é o bebé mais lindo que o mundo já viu.
Z., o realista avô, diz que a criatura parece um gato esfolado.
Trinta e seis anos passados, os que a conhecem dizem: acertado prognóstico, senhor doutor.
De facto, tudo na vida tem uma explicação.

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