Imaginem, por mero exercício de conjectura, uma rapariga que
viveu a maioria dos seus dias refasteladíssima em casa de seus pais, sem ter de
se preocupar em cozinhar ou limpar.
Imaginem que essa moça casa com um rapaz que vivia sozinho e
estava habituado às lides domésticas e até as encarava com galhardia, mantendo
a sua casa sempre limpa e arrumada.
Agora imaginem que os dois decidem partilhar tarefas,
ficando ela com a incumbência de cozinhar e ele de limpar a casa toda com
excepção da cozinha. Face aos antecedentes do moço, ela acredita que não haverá problemas.
E as coisas correm bem. Mas ela começa a notar que ele tem
uma visão um pouquito abrangente das tarefas dela, pois esquece-se amiúde de
ajudar a levantar a mesa, de pôr a loiça na máquina, de pôr a roupa a lavar e
depois a secar, etc. e tal.
Um dia, depois do jantar, ela vai carregar a máquina da
roupa e quando volta para a sala descobre-o a dormir a sono solto -rodeado
pelos filhos felinos- repousando sua despreocupada cabecita sobre um braço
fletido. Em cima da mesa repousam também os restos de salmão assado e os pratos
(os marafados não terão ido sozinhos para a cozinha!).
E agora imaginem que ela decide engrossar a sua colecção de
fotos em que ele está a dormir em posições pouco usuais (já tem algumas e
uma ou outra está num blog), porque pretende fazer um dia uma instalação artística a
exibir perante todos os amigos subordinada ao tema “estendido ou deitado”.
E ela decide que, assim sendo, mais vale usufruir do
privilégio de ter a cama só para si e poder dormir na diagonal (é um hábito que
esta heroína fictícia tem, que querem?). E, placidamente, deixa-o a dormir na
sala.
E no dia seguinte ele acorda com um torcicolo horrível e
dores no corpo todo.
Imaginem que isto acontecia. Seria um preço pequeno a pagar
por ter cagado para as tarefas domésticas, não?